Clivagens nos Temas de Imigração e Cidadania nos Programas Eleitorais para as Legislativas Portuguesas de 2025
- advogaciaportugal
- 12 de mai.
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As eleições legislativas de 18 de maio de 2025 em Portugal apresentam propostas divergentes nos temas de imigração e cidadania, refletindo visões distintas sobre o papel do Estado, direitos dos migrantes e a própria identidade nacional. A análise dos programas eleitorais dos principais partidos revela clivagens significativas que merecem análise aprofundada, pois representam diferentes modelos de gestão migratória e conceitos de pertença nacional.
Abordagens à Gestão Migratória
As propostas partidárias revelam uma clara divisão entre perspectivas restritivas e inclusivas na gestão dos fluxos migratórios. Esta clivagem fundamental define grande parte do debate político sobre o tema em Portugal.
Controle de Fronteiras vs. Integração
A Aliança Democrática (AD) propõe restaurar uma estrutura especializada no controlo de fronteiras através da criação da Unidade Nacional de Estrangeiros e Fronteiras, integrada na PSP. Esta medida representa um retorno parcial ao modelo anterior à extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) ocorrida em 2023. A AD pretende também rever o atual processo de emissão de atestados de residência pelas juntas de freguesia, propondo sistemas centralizados com limites ao número de testemunhos e atestados por imóvel.
O Chega adota a posição mais restritiva, defendendo medidas como a centralização das funções administrativas e policiais numa única entidade e a criminalização da residência ilegal. O partido propõe ainda a criação de quotas de imigração definidas exclusivamente com base nas necessidades do mercado de trabalho e a limitação do número de atestados de residência por habitação.
Em contraste direto, o Partido Socialista (PS) foca-se na criação de canais regulares e seguros de imigração, articulados com países de origem e trânsito, visando combater as redes de tráfico de seres humanos. Esta abordagem prioriza a criação de vias legais e seguras para a migração, em vez de reforçar mecanismos de controle fronteiriço.
O Bloco de Esquerda (BE) e a Coligação Democrática Unitária (CDU) enfatizam medidas de integração e agilização dos processos administrativos, como o reforço da capacidade da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA). A CDU propõe especificamente a criação de equipas temporárias para resolver os processos pendentes herdados do extinto SEF.
Acesso a Direitos e Serviços
Uma segunda grande clivagem refere-se ao acesso a direitos sociais e serviços públicos por parte dos imigrantes, com posições contrastantes sobre condições de acesso e universalidade.
Acesso Universal vs. Acesso Condicionado
O Bloco de Esquerda defende explicitamente o acesso universal ao Serviço Nacional de Saúde para todos os migrantes, independentemente de sua situação administrativa. Propõe também um programa especial de habitação para zonas com grande concentração de mão-de-obra migrante, reconhecendo as necessidades específicas dessas populações.
A CDU segue uma linha similar, enfatizando a promoção dos direitos sociais e laborais dos migrantes e o apoio especial a crianças e jovens estrangeiros, garantindo igualdade no acesso à educação, cultura e desporto.
Em contraste absoluto, o Chega propõe impor um período mínimo de cinco anos de contribuições para que imigrantes possam aceder a benefícios sociais. O partido também defende a expulsão de imigrantes que pratiquem crimes ou que não consigam garantir sua autossubsistência após um ano de permanência no país.
Políticas de Cidadania e Nacionalidade
A terceira grande clivagem concerne às políticas de cidadania e aos requisitos para obtenção da nacionalidade portuguesa, com diferentes visões sobre o que constitui pertença à comunidade nacional.
Requisitos para Nacionalidade: Restrição vs. Facilitação
A Aliança Democrática defende o alargamento do tempo mínimo de residência efetiva para obtenção da nacionalidade e propõe deixar de considerar o período de permanência ilegal no território nacional para esse efeito. Esta posição representa um endurecimento dos critérios atuais.
O Chega apresenta a posição mais restritiva, propondo limitar a atribuição da nacionalidade portuguesa apenas a quem demonstre uma "ligação real ao país", incluindo o conhecimento da história e cultura nacionais, domínio da língua portuguesa e boa conduta cívica. Mais controversa ainda é sua proposta de retirar a nacionalidade portuguesa a cidadãos binacionais que cometam crimes violentos.
A Iniciativa Liberal defende uma revisão dos requisitos para obtenção da nacionalidade portuguesa, reforçando critérios de integração efetiva, incluindo o domínio da língua portuguesa, o conhecimento das instituições democráticas e a ausência de antecedentes criminais graves.
Os programas do PS, BE e CDU não apresentam propostas específicas para alteração da Lei da Nacionalidade nos documentos analisados, o que pode sugerir uma posição de manutenção das regras atuais ou uma abordagem menos restritiva à questão da nacionalidade.
Abordagem ao Trabalho Imigrante
A quarta clivagem refere-se às diferentes visões sobre a relação entre imigração e mercado de trabalho, incluindo responsabilidades empresariais e mecanismos de integração laboral.
Regulação Laboral e Responsabilização Empresarial
O Partido Socialista articula diretamente imigração e mercado de trabalho, propondo que o Instituto do Emprego e Formação Profissional atenda imigrantes com visto de procura de trabalho em prazo máximo de 30 dias após entrada em Portugal.
Adicionalmente, propõe incentivos a empresas que garantam habitação, formação profissional e ensino do português aos imigrantes, com redução para metade dos prazos de concessão de vistos e autorizações de residência.
O Bloco de Esquerda foca-se na responsabilização da cadeia de angariação, utilização e subcontratação de imigrantes como forma principal de combate à exploração laboral. Esta abordagem coloca maior ênfase na fiscalização das entidades empregadoras.
O Chega, por sua vez, propõe medidas como impedir a entrada no país de estrangeiros sem contrato de trabalho, além de criar quotas de imigração definidas exclusivamente com base nas necessidades do mercado laboral. Esta visão instrumentaliza a imigração como resposta pontual às necessidades económicas.
Acordos Internacionais e Mobilidade Regional
Manutenção vs. Revogação de Acordos Internacionais
O Chega propõe explicitamente a revogação do acordo de mobilidade da CPLP, representando a posição mais radical de ruptura com acordos internacionais existentes em matéria de mobilidade.
Os demais partidos não mencionam diretamente mudanças nos acordos internacionais de mobilidade nos documentos analisados, o que sugere uma posição de manutenção dos compromissos existentes.
Os demais partidos não mencionam diretamente mudanças nos acordos internacionais de mobilidade nos documentos analisados, o que sugere uma posição de manutenção dos compromissos existentes.

Conclusão
As clivagens identificadas nos programas eleitorais para as eleições legislativas de maio de 2025 em Portugal refletem divisões profundas sobre a visão do país em relação à imigração e cidadania. Estas divergências vão além de questões técnicas ou administrativas, tocando em conceções fundamentais sobre identidade nacional, direitos humanos e o próprio modelo de sociedade.
De um lado, partidos como o Chega e, em menor medida, a AD defendem abordagens mais restritivas, com maior controle fronteiriço, requisitos mais rígidos para obtenção de nacionalidade e acesso condicionado a serviços e benefícios sociais. Do outro lado, PS, BE e CDU propõem medidas mais inclusivas, focadas na integração, desburocratização e universalização de direitos.
A Iniciativa Liberal ocupa uma posição intermediária em alguns aspetos, defendendo controles eficazes nas fronteiras, mas sem adotar o discurso mais restritivo do Chega. Estas posições divergentes configurarão o debate público sobre imigração e cidadania nos próximos anos em Portugal, com implicações significativas para as políticas públicas que serão implementadas após as eleições de maio de 2025.



